Por Roberto Amaral, na revista CartaCapital
O desafio brasileiro, de resolução urgente, não é apenas crescer, mas crescer e crescer muito, crescer com qualidade e a passo firme, a fim de superar a distância que nos separa das nações desenvolvidas, ou seja, crescer mais e melhor do que elas, caso contrário o fosso entre nós e elas só fará aumentar.
Fora do desenvolvimento (e não há desenvolvimento algum sem crescimento econômico), pensar em Brasil-potência é uma bela mas vã fantasia. O óbvio ululante às vezes precisa ser repetido à outrance: se o aumento da taxa de juros ajuda a frear a inflação, também é verdade que determina menos investimentos, menos empregos e, por conclusão, menor crescimento do PIB. Ou, dito pela forma inversa: quando os juros caem e cresce a oferta de crédito, cresce o consumo e com ele cresce a economia, e se abrem oportunidades para a poupança interna e para novos investimentos, reativando outra vez a economia, em um verdadeiro círculo virtuoso.
Pior do que não ter política alguma é ter duas políticas, ou tentar a conciliação entre objetivos que se anulam.
Ao desenvolver uma política fiscal expansionista, isto é, ao reduzir o superávit primário para dispor de maiores recursos e destiná-los a novos investimentos, e aumentar os gastos públicos, e mesmo quando prove desonerações fiscais, o governo tem por objetivo acelerar o ritmo de crescimento da economia. Ao retomar o viés de alta de juros, o Banco Central adota uma política monetária contracionista, recessivista, anti-desenvolvimentista. Até os economistas dos jornalões sabem que essas duas alternativas são auto-excludentes, no entanto, elas constituem, desde a última reunião do Copom, as duas pernas da política econômica brasileira. Cada uma numa direção.
Se todos concordamos – e eis nosso pressuposto - que é inaceitável o PIB do primeiro trimestre anunciado pelo IBGE (0,6%), se todos concordamos que é igualmente indesejável a expectativa, agora, de um crescimento de apenas 2,2 ou 2,5% do PIB em 2013, todos sabemos que a festejada alta dos juros (não mais uma alta episódica como se esperava que fosse no mês passado, mas a retomada do viés altista) vai afetar as projeções de crescimento da economia, e de passagem agravar o custo da dívida pública. E o câmbio apreciado mais uma vez deixará de ser atacado, mais uma vez e como sempre ‘por causa da pressão inflacionária’, e ‘por causa da pressão inflacionária’ é que mais uma vez se abandona a política de juros baixos, embora ela nos ajudasse a reduzir a valorização da taxa de câmbio nominal. E também por tudo isso se abandona o uso de controles de capitais, o que “tende a sufocar a indústria e a comprometer boa parcela da estrutura produtiva brasileira, desencadeando o fenômeno da especialização regressiva, ou, até mesmo, da desindustrialização” (Giuliano Conteto de Oliveira, no Valor Econômico).
Para combater uma inflação cedente nos primeiros cinco meses do ano, ressalvado o soluço de abril, o Banco Central, surpreendendo até as estimativas de palpiteiros profissionais, que previam 0,25%, aumentou a taxa Selic em 0,50%, elevando os juros para o patamar dos 8%. Mas, no dia seguinte, o dólar sobe 1,3% e termina o mês a R$ 2,137, a maior cotação desde maio de 2009. Os rentistas aplaudem, a avenida Paulista exulta, e o BC queima reservas. De passagem, o novo viés de alta, derrubando um dos bons pilares da política econômica da presidente Dilma, dá sua contribuição para o agravamento do custo da dívida pública. E já há economistas midiáticos defendendo, para breve, o salto desses juros para 9% concomitantemente com a queda dos níveis atuais de emprego, insistem desesperadamente nisto, ‘para assegurar o reajuste do salário real’ (em bom português, desemprego e queda dos salários), embora o crédito e os salários tenham crescido menos. O fato é que o Brasil está subindo as taxas de juros, enquanto quase todos os países baixam as suas.
O aumento da taxa de juros (e mais do que o exagerado aumento, a retomada do viés altista, repito) atendeu obviamente a uma pressão da mídia, que por sua vez repercute os interesses de bancos e rentistas, frontalmente golpeados pela ousada e necessária política relativa a juros bancários que o governo havia adotado. Calcule-se o significado de 0,5% de juros sobre o passivo público em letras do Tesouro e ver-se-á o tamanho desse presente do BC a banqueiros e jogadores nesses papéis que lastreiam a dívida pública interna. Algo em torno de cinco bilhões/ano. A pressão da mídia e da direita partidária sobre o BC e o alegre constrangimento deste em ceder, assumindo sua ‘independência’ (todo mundo agora é ‘independente’), foram tão óbvios que ficou mais do que nunca ensurdecedor o silêncio do governo e de seus aliados diante do cenário de derrota. Será timidez, impotência ou, quem sabe até, complacência? O presente maior, entretanto, não é a doação em dinheiro, e sim a ruptura da política de juros e da política de - mal ou bem - defender o desenvolvimento do país contra as concepções neoliberais fundomonetaristas de alegado combate à inflação e real fomento de desemprego, baixos salários e recessão.
(Aos que julgarem exageradas essas observações, sugiro rever, mesmo na grande mídia, os dados relativos à economia europeia sob o controle fundamentalista do FMI.)
Os dados revelados pelo IBGE, aqueles lamentáveis 0,6%, abaixo das mais pessimistas expectativas, põem por terra as esperanças e os justos desejos de um crescimento anual acima dos 3%. A estimativa de plantão, agora, fala em algo como 2,5%. Já é alguma coisa, se considerarmos os magros 0,9% do ano passado, mas um nada para país que precisa crescer, por pelo menos 10 anos seguidos, a taxas jamais inferiores a 5%. A questão intocada no debate que não se trava, rejeitada pelos monetaristas de todas as plumagens, é esta: como assegurar desenvolvimento, sem o qual não realizaremos destino algum.
Fica no ar outra questão: quem decide pela Nação o seu destino?
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