Com o fortalecimento do debate e a proposta do plebiscito, a direita vai ter de recuar, no que concerne ao referendo, que ela, de forma hipócrita, propôs ao governo e à sociedade.
Por Davis Sena Filho
As manifestações de junho movimentaram o tabuleiro político do Brasil e a rotina de vida dos brasileiros. Os protestos foram compostos em sua maioria por grupos de classe média, a exemplo de profissionais autônomos, pequenos e médios empresários, grupos políticos conservadores, bem como os de extrema direita e principalmente por estudantes, a grande maioria, filhos da classe média, além de segmentos partidários da extrema esquerda, que fazem oposição ao Governo do PT, da presidenta Dilma Rousseff e como sempre não enxergam o que está em jogo a um palmo à frente de seus narizes.
As manifestações deixaram claro que a classe média e também a população brasileira em geral quer mais do que já conquistou nesses últimos onze anos de governos trabalhistas, que, sem sombra dúvida, colocaram o Brasil em patamares de influência política e econômica jamais experimentados em nossa história em termos internacionais, bem como permitiu que o País americano fosse mais ouvido nos fóruns internacionais, a eleger, em 2011, o agrônomo José Graziano para diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), além de eleger este ano o diplomata Roberto Azevêdo para o cargo de diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), um dos órgãos internacionais mais influentes e poderosos do mundo.
Os dois dirigentes internacionais se elegeram no período dos governos trabalhistas de Lula e Dilma, receberam apoio incondicional dos mandatários ao tempo em que a imprensa alienígena e inimiga dos interesses do Brasil minimizava essas importantes conquistas políticas e diplomáticas, além de escalar comentaristas, colunistas e blogueiros para desmerecer a importância dessas vitórias ao ponto de certos jornalistas desqualificarem, inclusive, pessoalmente os dois mandatários brasileiros que conquistaram os postos mais importantes da FAO e da OMC. Ponto.
Este é o Brasil que as “elites” e a classe média se recusam a enxergar e a mostrar, por questões meramente ideológicas e preconceituosas, porque vivem e, consequentemente, efetivam a luta de classe. O gigante da América do Sul que combate a crise internacional com o seu forte mercado interno e liderou a criação do G-20, do Brics, além de fortalecer as relações sul-sul, ao invés de apenas ficar à mercê das relações diplomáticas e comerciais com os Estados Unidos e a União Europeia, ao fortalecer também o Mercosul e a Unasul e enterrar de vez a Alca, bloco que tinha por finalidade expor o fortíssimo mercado interno brasileiro aos produtos dos Estados Unidos, país useiro e vezeiro em proteger o seu mercado interno ao conceder subsídios a inúmeros produtos agrícolas e industrializados.
Os manifestantes formaram grupos heterogêneos, sem pautas organizadas e, por algum tempo, sem representantes para dialogar com o governo. Além disso, a sociedade brasileira percebeu a ausência da grande massa de trabalhadores vinculados às confederações e, consequentemente, aos milhares de sindicatos, urbanos e rurais associados às federações existentes em todos os estados do Brasil. Por sua vez, os avanços sociais e econômicos do povo brasileiro são inquestionáveis, basta que pesquisemos e verifiquemos os números e os índices no Portal da Transparência, nos portais de todos os ministérios e de instituições respeitadas, a exemplo do Banco Central, do IBGE e da Fundação Getúlio Vargas.
Contudo, os insatisfeitos foram às ruas e demonstraram ao Governo que os brasileiros querem mais, o que é justo e que ajudou a acordar o Palácio do Planalto quanto às reformas que estavam congeladas e à melhoria, por exemplo, da saúde e da educação, setores que receberam muitos recursos federais nesses últimos onze anos, apesar de em muitos estados e cidades a população não perceber os avanços, afinal as verbas orçamentárias são repassadas para os governadores e prefeitos, que têm o poder de direcioná-las para as áreas que eles consideram prioritárias.
Sabemos, por seu turno, que a crise brasileira do mês de junho não se traduz de forma simples e muito menos simplória como tentaram fazer crer os jornalistas da imprensa conservadora, e muito menos se aplica às crises europeias, japonesa e norte-americana, que são crises de fundo econômico, financeiro, imobiliário, que causaram amplo desemprego, queda dos índices das bolsas de valores, endividamento público, que estrangulou as economias de Itália, Espanha, Portugal, Grécia e Irlanda e atingiu países poderosos como a França e a Inglaterra.
A crise europeia que propiciou ainda eventos como fuga de capitais, escassez de créditos, diminuição de investimentos públicos, baixíssimo crescimento do PIB, além da intervenção do FMI, instituição que os brasileiros tão bem conhecem, com as suas receitas econômicas neoliberais, que combatem a doença matando o paciente, além de mexer com as estruturas sociais de inúmeros povos, que transformaram os seus dias em protestos desde o ano de 2008, que atingiram e ainda atingem em cheio a mais importante célula da sociedade, que é a família.
Entretanto, as passeatas, os protestos, as manifestações em todo o Brasil se tornaram violentas. Violência esta amenizada pelos grandes meios de comunicação, adversários históricos dos governantes trabalhistas, que precisavam, urgentemente, e há muitos anos, de uma pauta que ao menos questionasse e fizesse o Governo Federal, administrado por políticos do campo da esquerda sentirem pela primeira vez as insatisfações das ruas, mesmo a serem promovidas, nitidamente e indelevelmente, por membros da classe média de perfis evidentemente conservadores.
A saída do Governo e da presidenta Dilma Rousseff foi a proposta de chamar o povo brasileiro para decidir sobre questões brasileiras por intermédio de um plebiscito, que vai aprofundar discussões importantes como, por exemplo, a efetivação da reforma política, que vai mexer, sem sombra de dúvida, em estruturas arcaicas, viciadas, tanto no campo eleitoral quanto no campo partidário e que desde a República Velha e a ditadura militar mantém o País em um processo político e eleitoral ultrapassado, que favorece a corrupção, já que a Constituição de 1988 ainda tem artigos que ainda não foram regulamentados e por isto impedem a modernização do nosso sistema eleitoral.
A burguesia nacional, os barões da imprensa donos do sistema midiático privado e de mercado e a direita partidária, representada pelo PSDB, DEM e PPS, e com apoio de políticos de “esquerdistas” cegos do PSOL, já se mostraram contrários ao plebiscito, vão fazer, sem sombra de dúvida, campanha contra o plebiscito, porque a direita fala muito até um limite, pois quando percebem que o tiro saiu pela culatra no caso da proposta do plebiscito, ela recua para resguardar os seus interesses e os seus negócios, como sempre o fez através do tempo — dos séculos. A direita é, ideologicamente e doutrinariamente, violenta, cínica e hipócrita.
A verdade é que esses grupos econômicos, propriedades de empresários conservadores, e, portanto, de direita, não querem a reforma política, porque, do contrário, teriam mais dificuldades para financiar os seus candidatos, como os favorecem até hoje, em detrimento da maioria, com muito dinheiro. Os candidatos da burguesia são os políticos que possam defendê-los de maneira prática, além de servi-los como seus porta-vozes no Congresso, no Judiciário e no Executivo. Os interesses do grande empresariado urbano e rural são inconfessáveis e seus candidatos eleitos vestem os seus ternos como se vestissem os macacões repletos de propaganda dos pilotos de fórmula um. Não é necessário dizer mais nada, não é? Ponto.
O tiro dos conservadores saiu pela culatra, porque o Governo trabalhista já recebeu o apoio político dos partidos de sua base, além de receber recentemente no Planalto a visita das lideranças de diferentes matizes, como os movimentos sociais, as centrais sindicais, o LGBT, os movimentos urbanos, os movimentos de Juventude, bem como o Movimento pelo Passe Livre (MPL), o grupo responsável pelo o início das manifestações, com uma pauta de esquerda, que reivindicava que as tarifas de ônibus não aumentassem de preço, o que foi conseguido — conquistado.
A pauta dos transportes que foi o estopim dos protestos, que, de forma oportunista, manipulada e violenta, foi “abraçada” ou raptada pelos grupos midiáticos de direita, pela classe média reacionária e pelos políticos de partidos de oposição, a exemplo do PSDB, partido derrotado três vezes nas urnas e fracassado politicamente por não ter programa de governo e projeto de País, tentou se aproveitar das manifestações em proveito próprio, e, de forma ridícula, fazer o papel de intérprete de um movimento social que os políticos tucanos jamais vão interpretar de maneira séria, correta e pontual, porque se tem uma coisa que o PSDB, os barões da imprensa venal e de mercado e a classe média tradicional não conseguem compreender é exatamente o povo brasileiro.
As manifestações, na verdade, fortaleceram o campo da esquerda, porque ele se abriu ao debate, sem medo e com propostas concretas, pois além de baixar os preços das passagens de ônibus, convidou os movimentos sociais para o diálogo e dessa forma abrir a caixa preta do setor de transportes, como vão fazer, por exemplo, os prefeitos das duas maiores capitais do País — as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, além de muitas outras, obviamente.
O tempo vai se encarregar de mostrar os oportunistas e os trapaceiros da política e das mídias corporativas. A esquerda pegou a oposição conservadora com as calças nas mãos. Com o fortalecimento do debate e a proposta do plebiscito, a direita vai ter de recuar, no que concerne ao referendo, que ela, de forma hipócrita, propôs ao governo e à sociedade. A direita se esvaziou, porque com a proposta do referendo ela mostrou mais uma vez, e de forma inequívoca, que não está disposta a ouvir o povo e muito menos deixá-lo decidir sobre a reforma política, que no fundo retira os privilégios financeiros dos candidatos da direita, que sempre são os preferidos do grande empresariado nacional e internacional. A reforma política acaba com o caixa dois.
O povo pediu mudanças e a resposta governamental, volto a repetir, vem em forma de reformas, e a primeira das reformas é a política, que, se pararmos para pensar, foi um pé no peito da direita brasileira acostumada que está em abastecer o caixa dois dos candidatos dos empresários urbanos e rurais. A verdade é que o povo melhorou de vida nos últimos onze anos, e quer mais. E as manifestações diziam exatamente isto: “queremos mais!” E o povo vai ter, porque o Brasil efetiva um processo inexorável, que é a busca pelo seu desenvolvimento social e econômico. Somos o sexto PIB do mundo, bem como respeitados no exterior. O povo pede e exige, e vai ter a resposta em forma de mudanças e reformas.
Não dá mais para o governo e a sociedade tergiversarem sobre os fatos e os acontecimentos. A direita quis, com má-fé e ridiculamente, tomar para si a voz das ruas, mas é o campo da esquerda que é orgânico, pois inserido e sedimentado historicamente na sociedade organizada. Não duvide. Portanto, vai ser por este caminho que as reformas vão seguir: o caminho proposto e debatido com um governo de esquerda e trabalhista. Afinal, queremos ter um Brasil justo e democrático para o povo viver. As reformas vão vir.
A partir de agora veremos se a direita partidária e se os barões midiáticos de negócios privados estão mesmo a favor de mudanças no Brasil. Os conservadores tentaram atirar no que viram e acertaram no que não viram: o plebiscito e o chamado do governo para a sociedade organizada e o povo decidirem sobre a reforma política. A mudança, irrefragavelmente, vai ajudar o Brasil a andar nos trilhos e aperfeiçoar o seu sistema político, partidário e eleitoral, e, evidentemente, favorecer a eleição de políticos responsáveis e comprometidos.
Por seu turno, a reforma política vai permitir que o Brasil combata melhor a corrupção, e, por conseguinte, ter acesso a uma infraestrutura que beneficie a todos, além de proporcionar que a sociedade seja favorecida por sistemas educacional e de saúde de melhor qualidade, como foram reivindicados pelos manifestantes. Portanto, vamos ao plebiscito e não esqueçamos de observar aqueles que preferem, por conveniências e interesses próprios, o referendo. Assim saberemos quem está de boa fé ou de má fé; quem é sincero e quem é falso. É isso aí.
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